Agradar o cliente exige mais iniciativa do que dinheiro

Fonte: Jornal do Comércio
09/10/2017
Gestão

Captar, reter e fidelizar. Esse é o mantra que ronda (ou deveria rondar) diariamente a cabeça de gestores e empresários de todos os segmentos, seja de pequeno, médio ou grande porte. Pensar e entender o cliente é algo que nunca cai em desuso, mas é uma estratégia que se acelera em mercados mais concorridos ou em meio a crises. Entre os desafios, está a difícil tarefa de surpreender o consumidor. Mas, ainda assim, todo mundo que tem um negócio precisa fazer isso, e tão bem-feito quanto deseja que seja o seu produto final.

"O que menos vemos são estratégias eficazes para fidelizar, manter e atrair clientes de volta ao ponto de venda", avalia Luciana Fabula, professora da Fundação Dom Cabral nas áreas de Estratégia e Marketing. O que prevalece, aponta ela, são ações despreparadas e que não contemplam as reais necessidades do consumidor.

Especialistas na área, em geral, ressaltam que o ponto central é entender o que é valor para o consumidor. É neste valor (nem sempre simples de ser descoberto), que deve estar baseada qualquer estratégia de captação, retenção e fidelização. Essa ação ainda deve ser pontual e personalizada. Mas muito do que vigora no mercado, diz Luciana, são empresas ainda com dificuldade de sair do tripé preço/desconto/forma de pagamento.

É fato, também, que muitos gestores não estão preparados para algo complexo de ser feito: estar próximo do cliente e extrair dele o que realmente é um diferencial para na tomada de decisão, na hora de voltar ou não a comprar de sua empresa. Se no início dos anos 2000 ainda se falava muito em pesquisas milionárias para estabelecer uma campanha de fidelização, diz a professora da Fundação do Cabral, hoje essa definição precisa ser mais ágil e feita de forma mais simples, na conversa em frente ao balcão, com a presença até mesmo de executivos mais perto do consumidor final.

Luciana usa um estudo da Bain & Company, consultoria internacional de estratégias empresariais, para mostrar o distanciamento entre uma ponta e outra do negócio ou seja, entre o gestor e o cliente. A consultoria perguntou a executivos de 362 grandes companhias se achavam estar entregando valor aos clientes. Cerca de 80% disse que sim. Mas os pesquisadores da Bain & Company perguntaram aos clientes dessas mesmas companhias se eles consideravam que a empresa estava lhes entregando algo com valor, e apenas 8% respondeu que sim. A esse distanciamento se denominou Delivery Gap.

"Isso ocorre porque gestores e empresários costumam achar que conhecem muito bem os produtos que vendem e seus atributos, que sabe o que o cliente quer, esquecendo de ouvir o próprio cliente", critica Luciana. Uma das ações que mais tem sido adotadas para combater o Delivery Gap, diz a professora, é determinação de muitas companhias para que o chamado C Level (nível de chefia) tenha, entre suas metas, passar determinada quantidade de horas na "ponta" do negócio. Parte dos gestores, porém, ainda não percebeu a vantagem dessa estratégia e adota a ação "quase que obrigados". A especialista, porém, avalia a medida como muito positiva para reduzir o descompasso entre a crença e a realidade.

Atrair, engajar e fidelizar clientes exige, ainda, criar processos internos mais eficientes, com projeção de cenários que ajudem a chegar nas ideias certas. E uma das metodologias que ganha espaço entre gestores é saber, com detalhes, o caminho percorrido pelo seu cliente para chegar à sua empresa. "Isso engloba a forma como o consumidor descobriu a empresa e referências que já têm daquele negócio", ressalta a coordenadora de Cursos do Labfin-Provar, da Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo (FIA/USP), Renata Nieto.

Lúcio de Carli, professor de pós-graduação da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), ressalta que, em qualquer situação, não se pode esquecer que o consumidor têm necessidades crescentes ao longo do tempo. E o empreendedor tem o desafio da superação constante dessas expectativas, mas tende a oferecer os mesmos benefícios ao longo desse relacionamento, insistindo, em alguns casos, em ações que um dia deram certo, mas já estão ultrapassadas. "Somos, por natureza, insatisfeitos logo após termos uma necessidade atendida", adverte Carli.

Outro erro comum, avalia o professor, é promover uma ação e depositar a estratégia em um valor que, na verdade, é algo básico. Não é incomum um gestor descrever como um atributo de sua empresa ou produto algo que é comum até mesmo na concorrência, alerta Carli. E, no caso desta avaliação errada, não há mantra que resolva.
 

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