Atentado contra os pais também é causa de exclusão da herança

Fonte: IBDFAM
30/05/2022
Direito de Família

Por entender que a interpretação do dispositivo legal deve ir além da literalidade e considerar os valores éticos que ele protege, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ excluiu da herança um homem que matou os pais quando tinha 17 anos. O colegiado declarou a indignidade do recorrente e o excluiu da herança deixada pelos pais, ainda que, tecnicamente, não se tratasse de homicídio doloso – como consta da lei –, mas de ato infracional análogo, pois foi cometido na adolescência.

Na decisão unânime, o STJ rejeitou o recurso especial do homem e confirmou que a conduta está abrangida pela regra do artigo 1.814, inciso I, do Código Civil, que exclui da sucessão quem atenta contra a vida do autor da herança. A alegação do recorrente era de que o ato praticado não se enquadraria nas hipóteses de exclusão da sucessão, as quais estariam taxativamente elencadas na lei e deveriam ser interpretadas estritamente, por serem regras restritivas de direito.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, o rol do artigo 1.814 do Código Civil é taxativo, o que impede a criação de outras hipóteses por meio da analogia ou da interpretação extensiva. A magistrada ponderou que, caso se interpretasse literalmente o dispositivo – que contém a palavra "homicídio" –, o recorrente não seria excluído da sucessão, pois o que houve foi um ato infracional análogo ao crime de homicídio.

A relatora ressaltou, porém, que o fato de ser taxativo não determina que o rol seja interpretado de forma literal. "Frequentemente, confunde-se taxatividade com interpretação literal (cronologicamente a primeira, e substancialmente a mais pobre das técnicas hermenêuticas), o que é um equívoco."

Razões éticas e morais

Nancy Andrighi explicou que a exclusão de herdeiro que atenta contra a vida dos pais é uma cláusula geral fundamentada em razões éticas e morais, a qual está presente nas legislações desde o direito romano. Lembrou ainda que, no Brasil, o núcleo essencial dessa regra é a exigência de que a conduta do herdeiro seja proposital (dolosa), ainda que a morte não se concretize, pois o bem jurídico que se pretende proteger é a vida dos pais.

De acordo com a ministra, a norma do Código Civil deve ser entendida como: não terá direito à herança quem atentar, propositalmente, contra a vida de seus pais, ainda que a conduta não se consume, independentemente do motivo. "É por isso que a diferença técnico-jurídica entre o homicídio doloso (praticado pelo maior) e o ato análogo ao homicídio doloso (praticado pelo menor), conquanto seja de extrema relevância para o âmbito penal, não se reveste da mesma relevância no âmbito civil."

A relatora concluiu que a diferenciação é pouco relevante no caso em análise, porque os valores e as finalidades (prevenção e repressão do ilícito) que nortearam a criação da norma civil pressupõem a produção dos mesmos efeitos, independentemente de o ato ter sido cometido por pessoa capaz ou por relativamente incapaz, sob pena de não se atingir a sua finalidade preventiva.

Ao manter o acórdão, frisou ser “incontroverso o fato de que o recorrente, que à época dos fatos possuía 17 anos e seis meses, ceifou propositalmente a vida de seu pai e de sua mãe". O número do processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

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