Justiça concede convívio a pai que não via filha há 7 meses

Fonte: IBDFAM
14/02/2022
Direito de Família

Um pai garantiu, na Justiça do Rio de Janeiro, o direito a conviver com a filha, cuja mãe vem mudando de endereço sucessivamente. Eles poderão passar finais de semana, quinzenalmente, assistidos por pessoa de confiança da genitora até a resolução do processo. A decisão da 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – TJRJ também fixou que a demanda tramite em uma das varas na localidade em que vive o autor da ação, estabilizando a competência ali firmada.

Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a advogada Isabela Cristina Loureiro dos Santos atua no caso, representando o pai da criança, em parceria com Taiane Assis, que compõe sua equipe. Ela explica que, em casos envolvendo menores de idade, a fixação de competência geralmente se dá de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/1990). Optou-se, porém, pelas regras do Código de Processo Civil – CPC (Lei 13.105/2015), com o entendimento de que assim se atenderia ao melhor interesse da criança, dadas as peculiaridades do caso.

A ação trata da suspensão de poder familiar, em que foi interposto recurso de agravo de instrumento contra decisão que declinou processo para o Estado de São Paulo. O autor da ação requereu a fixação de competência no Rio de Janeiro, considerando a ocorrência de mudanças de endereço sucessivas da parte contrária, em curto período, e sem comunicar ao juízo e sem anuência do pai de sua filha, o que acaba postergando qualquer tipo de decisão na demanda. Também pediu a regulamentação da convivência, ainda que assistida.

Decisão anterior havia declinado a competência para a comarca do interior de São Paulo, último endereço informado pela genitora, mas onde ela nem sequer reside mais. O entendimento era de que “as demandas que versam sobre posse e guarda de menor devem ser propostas no domicílio atual deste, observando que o que se quer é a preservação do seu interesse, através da facilitação de sua defesa, e checagem exata do seu ambiente social, com a melhor e direta colheita dos dados probatórios a tanto”.

Desembargador identificou “conduta dolosa e furtiva”

“A genitora comete diversas violações e vem-se mudando de forma sucessiva e reiterada, não deixando que o processo, enfim, tramite adequadamente, não podendo a mesma ser beneficiada pela sua conduta dolosa e furtiva”, observou o relator no TJRJ, desembargador Cleber Ghelfenstein. Ele destacou que o caso não é de simples litígio familiar, “tendo havido início de estudo psicossocial, indicando inclusive o risco da genitora à infante”.

O magistrado considerou as peculiaridades da situação e a necessidade de objetivar o melhor interesse da criança ao suspender a decisão de declínio. Assim, o processo deverá tramitar em uma das varas da localidade específica no Rio de Janeiro, onde vive o autor da ação. A decisão fixou ainda o convívio entre pai e filha, seja em finais de semana, sábado e domingo, quinzenalmente, das 9 às 17 horas.

“Em que pese não seja matéria da decisão atacada, em razão do princípio do melhor interesse da criança, requer seja fixada em sede de recurso, alguma forma de convívio do genitor e sua filha para que as falsas memórias não sejam definitivamente implementadas e se restaure o vínculo paterno-filial, uma vez que já se passaram meses sem que o pai veja sua filha”, concluiu Ghelfenstein.

Decisão não se ateve à letra crua da lei, diz advogada

A advogada Isabela Loureiro dá mais detalhes sobre o caso: “Foi sustentada estabilização da competência no juízo em razão das alterações sucessivas de domicílio da genitora da infante, mesmo após início de estudo psicossocial sem o devido comparecimento da genitora com a criança, o que fez com que o processo continuasse se arrastando por meses sem fixação de convívio do genitor, pelo magistrado de piso. Foi necessária fixação de convívio de ofício em segunda instância, uma vez que não havia apreciação dos pedidos quanto ao convívio do genitor, ainda que de forma assistida”.

Para ela, a decisão do TJRJ foi extremamente acertada. “Visa garantir o melhor interesse da criança, que é o objetivo do legislador quando dispõe as regras de fixação de competência do ECA. Contudo, como é sabido, a fixação de competência pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é seguida pelo domicílio do guardião da criança”, ressalta a advogada.

“Mantendo uma interpretação crua da lei, sem levar em consideração todas as provas anexadas, o processo em questão deveria ser declinado e fixada sua competência no domicílio onde a criança se encontrava. Contudo, como já mencionado, a genitora vinha se mudando sucessivamente e durante sete meses o genitor vinha e vem sendo privado do convívio com sua filha, mesmo sem existência mínima de provas que conduzam ao seu afastamento.”

Ela explica que, em grau de recurso, o desembargador responsável pelo caso atendeu ao pedido de fixação de competência pelo regramento do Código de Processo Civil, excepcionalmente, estabelecendo como competente o juízo em que foi proposta a demanda. O entendimento foi de que assim seria melhor atendido o interesse da criança e o processo, enfim, prosseguiria.

“Impecável o posicionamento do magistrado, pois a interpretação da norma deve sempre atender ao seu objetivo e o julgador não pode se ater à letra da lei simples e crua, sem levar em consideração seu contexto fático”, elogia Isabela. “Nosso próximo passo é fazer cumprir a determinação do magistrado, sem obstáculos, restabelecendo o convívio entre genitor e filha, além de concluir o estudo psicossocial, que é primordial para atender aos interesses da criança, que vêm sendo violados desde então.”

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