Novas regras para liberar benefício podem levar corrida à Justiça

Fonte: Extra
29/04/2022
Direito Previdenciário

Mais de 2 anos após a promulgação da reforma da Previdência de 2019, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) atualizou os critérios para administrar, reconhecer, manter e revisar os direitos dos beneficiários do instituto. A Instrução Normativa 128/2022, publicada em 29 de março, trouxe muitas mudanças. Entre elas: limitação da contagem de tempo do auxílio-doença na aposentadoria e ação de herdeiros para melhorar benefício de segurado já falecido; alteração da prova de união estável e no formulário que garante aposentadoria especial, ampliação do tempo para comprovação de qualidade de segurado. Todas essas alterações, segundo o INSS, visam reduzir a fila de requerimentos em espera no instituto que, segundo dados de março, está em 1,6 milhão.

De acordo com Paulo Bacelar, diretor do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), a demora de mais de dois anos na atualização da instrução (a 128/2022 substitui a 77/2015) gerou muitas dúvidas.

— A nova IN interpretou regras que já estavam valendo antes. Em relação aos procedimentos, não foram muito alterados, mas a normatização dos benefícios teve uma mudança mais profunda. O que o IBDP levanta é que o procedimento avança pouco em relação ao que tínhamos e o que avança, vai muito mal — diz Bacelar, que prevê judicialização por conta das novas regras.

— O que foi alterado está distante de uma redação ideal — adverte Alexandre Triches, diretor de processo administrativo do IBDP.

Entre as críticas ao documento, segundo o instituto previdenciário, está a falta de acesso da população ao Portal IN, que traz todas as portarias, memorandos, fluxogramas, quadros comparativos da instrução antiga com a atual, e resumos, que permitem maior compreensão sobre as mudanças.

— Todos os atos da administração devem ser públicos e transparentes, não fazendo nenhum sentido limitar o acesso a estes instrumentos, que tutelam direitos coletivos ou individuais — diz Adriane Bramante, presidente do IBDP.

Triches estranhou o posicionamento do INSS: — “Todo o foco vem no sentido de um serviço mais digital, tecnológico, e no lançamento da IN, defende a reabertura de todas as agências, para o atendimento presencial”.

O advogado lembra que para que isso aconteça é necessário a contratação de mais servidores, equipamentos novos, internet boa e uma estrutura física adequada.

Nova instrução é menor que a anterior

O que causou estranheza da diretoria do IBDP, foi que, com todas as inovações, leis, regras e emendas, a quantidade de dispositivos lançados nesse período, a nova IN é menor que a 77/15. Segundo o instituto, o texto trouxe 200 páginas e 10 portarias, e mesmo assim alguns temas foram tão resumidos que acabaram desconfigurados. A anterior tinha 660 páginas.

Há partes em que o texto antigo trazia como “dever do INSS pedir ao segurado o documento faltante” e recebeu a alteração para “obrigação do segurado trazer o documento indispensável ao processo”.

— Isso dá a ideia de que responsabilidade passa a ser do segurado e não mais do servidor — acredita Adriane Bramante.

Era esperado que o INSS juntasse inúmeros temas na instrução normativa, mas isso não aconteceu. Um exemplo está no tempo de auxílio-doença como tempo especial que se consegue na Justiça (Tema 998 do STJ), mas não na via administrativa. Isso gera entrada de processos na Justiça porque já existe decisão favorável em recurso repetitivo. Detalhes mal redigidos também podem motivar ação, avaliam especialistas do IBDP.

— Já existe um acordo entre o INSS, Advocacia-Geral da União, Conselho de Justiça Federal e Superior Tribunal de Justiça para desjudicialização. Mas a instrução recém lançada não traz esse espírito colaborativo. Tal decisão pode até diminuir a fila do INSS, mas pode levar essa fila para a Justiça, o que custará mais caro para o brasileiro — ressalta a presidente do IBDP.

Arquivamento e recursos

Outro ponto criticado pelo instituto é o arquivamento de requerimento de aposentadoria caso falte algum documento, como identidade e CPF, por exemplo. Se o segurado não cumprir a exigência no prazo, o pedido será arquivado e não caberá recurso.

— Não caberá recursos em processos indeferidos no INSS. No entanto, pelo fato de o Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS) ser um órgão autônomo e relação ao instituto, a Instrução Normativa 128 não pode interferir no que o conselho vai ou não julgar na fase recursal — avalia Adriane Bramante, que acrescenta que o CRPS não está vinculado ao INSS, ele é autônomo.

Herdeiros

Os dependentes agora não podem mais exercer atos de cunho pessoal do falecido, tais como: desistência, reafirmação da Data de Entrada de Requerimento (DER), complementação de contribuições ou opção por benefício mais vantajoso.

A reafirmação da DER é a possibilidade de mudar o dia do pedido do benefício para uma data mais vantajosa ao segurado, fazendo com que ele consiga ter acesso a uma aposentadoria melhor.

Formulário PPP

O IBDP, no entanto, avalia que alguns pontos positivos merecem destaque. Como por exemplo, a alteração no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), formulário que registra o tempo de serviço especial. Segundo Adriane Bramante, houve mudanças na parte estética, além de exclusão e inclusão de itens.

— Foi excluída a existência de monitoração biológica, que eram os campos 17 e 18 — diz Adriane, que explica que o INSS já não exigia mais essa informação porque existe resolução do Conselho Federal de Medicina ligada ao sigilo médico da informação sobre manipulação biológica.

Outra alteração é que o engenheiro de segurança do trabalho e o médico do trabalho não precisam mais informar o Número de Identificação do Trabalhador (NIT), somente é exigido o CPF.

União estável

A mudança na comprovação da união estável, na avaliação do instituto, também foi positiva. Desde 2019 o INSS exigia a documentação comprobatória da união dos últimos 24 meses antes do requerimento. Ou seja, o segurado que fica viúvo deveria levar, no mínimo, dois documentos recentes ao instituto para ter o direito reconhecido. Mas agora, não será preciso levar duas provas documentais, uma já será suficiente.

— Uma prova será suficiente para fazer o procedimento de justificação administrativa, que é o pedido para apresentar testemunhas ao INSS, para fazer a prova de união estável — explica Adriane.

Qualidade de segurado

Em caso de desemprego, o segurado contribuinte individual, terá a qualidade de segurado — que permite o gozo de benefícios previdenciários mesmo sem pagar o INSS — prorrogada por mais 12 meses além dos 12 meses atuais.

Esse tempo varia de seis meses a três anos de manutenção da qualidade de segurado, que garante o direito a benefícios do INSS, dependendo do tipo de vínculo empregatício e de quanto tempo o segurado pagou as contribuições de forma ininterrupta.

Auxílio-doença

O período de auxílio-doença, atual benefício por incapacidade, será contado como tempo de contribuição, se intercalado com períodos de atividade ou contribuições. Neste caso, pontua Adriane, o entendimento está mais favorável que o reconhecido pela Justiça, que só aceita período intercalado caso tenha atividade remunerada.

No entanto, nos casos de aposentadoria especial, esse período ficará limitado. Isso porque a nova norma retira a possibilidade de contar como especial o tempo de afastamento do trabalhador que atuava em atividade prejudicial à saúde e passou um período recebendo o auxílio-doença. Com isso, profissionais de áreas que oferecem risco que tiveram afastamentos podem não conseguir a aposentadoria especial.

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